Capítulo 20 – Medindo Águas

-“Na extremidade mais grossa do prumo de mão há uma cavidade que se enche de sebo, para trazer uma amostra do fundo.
Todos ouviam, em silêncio respeitoso, como se podia medir a profundidade das águas:
-“A linha é igual à de barca e gradua-se da seguinte maneira: faz-se uma mãozinha num dos chicotes, para encapelar na alça do prumo e, do seio da mão da linha, mede-se a primeira braça, ou um metro e oitenta e três, que se marca com um bocado de merlim, onde se dá um nó; a segunda com dois nós, a terceira com três nós, a quarta com quatro nós, e a quinta com um coiro. Marcam-se novamente um, dois, três, quatro nós, na sexta, sétima, oitava e nona braças, e a décima com uma pinha de anel. Da décima primeira à décima nona, a mesma marcação da primeira à nona e, na vigésima, duas pinhas.
A Álvaro esta marcação lhe faz lembrar o cordame da arquitectura Manuelina, a qual neste preciso instante decide fazer renascer nos seus futuros projectos.
-“A milha marítima adoptada como unidade de distância é de mil oitocentos e cinquenta e dois metros e dá-se-lhe o nome de nó, do mesmo modo como se graduavam as linhas de barca. Com uma barquinha na ponta de um carretel, se media a velocidade do navio, com a ajuda de uma ampulheta.
O estudante observa agora a carta da Barra de Lisboa, cotejando os alinhamentos e a direcção dos ventos favoráveis com as explicações que Henrique dera:
-“Os enfiamentos da marca da Mama com a marca de Caxias, e da marca da Mama com a marca da Boa Viagem, definem um sector no qual está compreendida a parte navegável da Barra Grande ou Canal do Sul, sendo o eixo dado pelo enfiamento da Mama com os farolins do Esteiro e da Gibalta.
Wirsung, de óculos escuros, gravava o gemido das cordas esticadas e o drapejar dos panos, em som de fundo marulhado com flautas de gaivotas ao longe, à vista de Lisboa.
-“A largura deste canal, na entrada do rio, é de seis amarras, ou seja, setecentas e vinte braças. Há anos, as coroas de areia que rodeavam a Torre do Bugio deslocaram-se um pouco mais para o norte, invadindo com o seu baixo fundo o limite sul da Barra Grande. Para o evitar, convém manter-se sempre no eixo até um pouco mais adiante do que era usual e segui-lo até que a margem norte – Junqueira, Alcântara, fique ocultada pela Torre de Belém. Entrar então no Tejo livremente.
Luciana reconhecia estas perspectivas, mas o seu olhar descobria agora outras relações cromáticas, de reflexos e tonalidades, em total expansão de brilhos sobre a líquida planura.
-“A corrente da vazante chega a atingir cerca de cinco nós, quando se dá a coincidência de marés vivas com águas do monte. Normalmente, a velocidade da vazante é de cerca de dois a quatro nós, conforme as marés, sendo a corrente mais acentuada a meio do rio, por alturas de Cacilhas, e de meio rio para norte, a partir da Torre de Belém para Oeste. Na enchente, a corrente é sensivelmente mais fraca, apresentando-se com velocidades de um a três nós. Com marés mortas e águas do monte chega quase a não haver inversão da corrente, que normalmente se dá uma hora depois da preia-mar ou da baixa-mar. A duração da maré é de seis horas, havendo, por consequência, duas preia-mares e duas baixa-mares em cada vinte e quatro horas.
Domingos cita os perigos a que se deve dar resguardo.
Na margem norte os baixos de areia da Cruz Quebrada, as pedras de Caxias, os Papa-Lemes em Paço d’Arcos, Penedo Pardal, Ferraduras de Santo Amaro, Catalazete, Pedra do Sal, Almagreiro, Boca do Asno e Cidadela de Cascais.
Na margem sul o Calhau do Mar e Cabra Assada, Trafaria.

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